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TDAH e relacionamentos amorosos: O impacto invisível que pode estar sabotando seu amor

Emiliano Macedo

Emiliano Macedo

29 de maio de 2025

Foto - Divulgação

Neurologista alerta: casais afetados pelo TDAH têm até 3 vezes mais chance de separação quando o transtorno não é tratado


Enquanto o mês de junho traz consigo as comemorações do Dia dos Namorados, 1 em cada 30 casais brasileiros enfrenta um desafio invisível que pode estar minando silenciosamente seu relacionamento. O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) em adultos, condição que afeta aproximadamente 3% da população, não é apenas um problema individual – é uma questão que transforma profundamente a dinâmica do casal.


“O que muitos interpretam como falta de amor, compromisso ou respeito pode ser, na verdade, manifestação de um transtorno neurobiológico tratável”, alerta o Dr. Matheus Trilico, neurologista referência nacional em TDAH adulto. “Casais onde um dos parceiros tem TDAH não diagnosticado ou não tratado enfrentam um risco até três vezes maior de separação nos primeiros cinco anos de relacionamento. Este junho, enquanto celebramos o amor, é o momento ideal para reconhecer e abordar esses desafios invisíveis.”


A dança neurobiológica do amor com TDAH


Imagine um relacionamento como uma dança sincronizada. Para o parceiro com TDAH, é como dançar ouvindo uma música diferente – o cérebro processa informações, emoções e tempo de maneira distinta. Esta “dança dessincronizada” cria padrões de interação que podem deteriorar até os relacionamentos mais promissores.


“A neurobiologia do TDAH afeta diretamente três pilares fundamentais de qualquer relacionamento: comunicação, regulação emocional e consistência”, explica Dr. Trilico.


“Quando um parceiro tem dificuldade em manter o foco durante conversas importantes, esquece compromissos significativos ou reage impulsivamente durante conflitos, nem sempre é por falta de amor ou consideração – pode ser o TDAH manifestando-se na relação.”


Sinais de alerta: Quando o TDAH está sabotando seu relacionamento


Segundo Dr. Trilico, certos padrões são particularmente reveladores:


• Um parceiro constantemente se queixa de não ser ouvido, enquanto o outro jura estar prestando atenção;
• Discussões que escalam rapidamente devido a reações emocionais intensas e aparentemente desproporcionais;
• Promessas repetidamente quebradas apesar das melhores intenções;
• Um padrão de “pai/mãe e filho(a)” onde um parceiro assume responsabilidades desproporcionais;
• Dificuldades financeiras recorrentes devido a compras impulsivas ou contas esquecidas.


“Estes não são simplesmente ‘problemas de relacionamento’ – são manifestações específicas de como o TDAH afeta a dinâmica do casal”, enfatiza o especialista. “Reconhecê-los é o primeiro passo para transformar o relacionamento.”


O fenômeno do “acasalamento assortativo”: quando TDAH atrai TDAH


Um dos aspectos mais fascinantes revelados pela ciência recente é o fenômeno conhecido como “acasalamento assortativo”. “Estudos mostram que pessoas com TDAH frequentemente se sentem atraídas e formam relacionamentos com parceiros que também apresentam sintomas do transtorno, mesmo que não diagnosticados”, revela Dr. Trilico.

Esta descoberta, publicada no Journal of Attention Disorders em 2022, explica por que certos casais enfrentam desafios amplificados. “Quando ambos os parceiros têm dificuldades com organização, planejamento financeiro ou regulação emocional, o relacionamento pode entrar em espirais caóticas”, explica. “Paradoxalmente, muitos destes casais relatam forte conexão inicial e entendimento mútuo, seguidos por períodos de intenso conflito.”

O lado sombrio que ninguém discute: TDAH e violência nos relacionamentos


Um dado alarmante que raramente entra nas discussões sobre TDAH é sua correlação com violência em relacionamentos íntimos. “Pesquisas científicas recentes indicam que adultos com TDAH têm maior probabilidade de se envolver em situações de violência por parceiro íntimo, tanto como perpetradores quanto como vítimas, independentemente do gênero”, alerta Dr. Trilico.


Este risco aumentado, documentado em estudo publicado na Scientific Reports, não significa que pessoas com TDAH sejam inerentemente violentas. “A impulsividade, dificuldade de regulação emocional e problemas de comunicação podem criar situações onde conflitos escalam rapidamente”, esclarece. “Identificar e tratar o TDAH pode ser uma intervenção crucial para prevenir a violência doméstica em casos específicos.”


A perspectiva do parceiro neurotípico: “Estou ficando louco(a)?”


Para o parceiro sem TDAH, a experiência pode ser profundamente confusa e desgastante. “Muitos parceiros neurotípicos relatam sentimentos de frustração crônica, exaustão emocional e até questionam sua própria sanidade”, comenta Dr. Trilico.


Ana M., 42 anos, casada há 15 anos com um homem diagnosticado com TDAH aos 39, compartilha: “Por anos, pensei que havia algo errado comigo. Ele prometia mudanças, parecia sincero, mas os mesmos problemas continuavam acontecendo. Depois do diagnóstico e tratamento, finalmente entendi que não era falta de amor ou consideração – era o TDAH. Esta compreensão salvou nosso casamento.”


Caminhos comprovados para transformar o relacionamento


Apesar dos desafios, Dr. Trilico enfatiza que relacionamentos afetados pelo TDAH podem ser extremamente gratificantes com as estratégias corretas:


• Diagnóstico e tratamento adequados: “O tratamento multimodal, incluindo medicação quando apropriada e terapia comportamental, pode transformar radicalmente a dinâmica do casal.”
• Terapia de casal especializada: “Busque terapeutas familiarizados com TDAH em adultos. Abordagens convencionais podem não abordar as necessidades específicas destes casais.”
• Sistemas, não promessas: “Implementem sistemas externos de organização e lembretes, em vez de confiar na memória ou força de vontade.”
• Comunicação estruturada: “Estabeleçam momentos específicos para conversas importantes, utilizem técnicas como o ‘bastão da fala’ (apenas quem está com o objeto pode falar) e criem pausas planejadas durante discussões acaloradas.”
• Educação mútua: “Ambos os parceiros precisam compreender como o TDAH funciona. Leiam livros, assistam palestras e participem de grupos de apoio juntos.”


“Não espere que os sintomas do TDAH deteriorem ainda mais seu relacionamento”, adverte Dr. Trilico. “Com o conhecimento e as ferramentas certas, o Dia dos Namorados pode marcar o início de uma nova fase em seu relacionamento – uma onde o TDAH é compreendido e gerenciado, não um obstáculo invisível – ou uma desculpa – entre vocês.”


Sobre o Dr. Matheus Trilico


Dr. Matheus Luis Castelan Trilico – CRM 35805PR, RQE 24818.
• Médico pela Faculdade Estadual de Medicina de Marília (FAMEMA);
• Neurologista com residência médica pelo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC-UFPR);
• Mestre em Medicina Interna e Ciências da Saúde pelo HC-UFPR
• Pós-graduação em Transtorno do Espectro Autista
Mais artigos sobre TEA e TDAH em adultos podem ser vistos no portal do neurologista: https://blog.matheustriliconeurologia.com.br/

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